Vivendo nova tragédia, mãe de Eliza Samudio é criticada por vaquinha online

Doze anos após perder a filha, Sônia Moura, mãe de Eliza Samudio, enfrenta uma nova tragédia com seu marido, Hernane Silva, que entrou em estado vegetativo após sofrer diversas paradas cardiorrespiratórias. Amiga de longa data de Sônia, a psicóloga Maria do Carmo criou uma vaquinha online para ajudá-la em mais um momento difícil, mas, ainda que o financiamento coletivo esteja superando as expectativas, nem assim a família deixa de ser alvo de críticas.

Tanto Sônia quanto Maria do Carmo se depararam com comentários negativos, alguns “mandando Sônia trabalhar" para pagar as despesas médicas do marido, que, antes de ser hospitalizado, era o provedor financeiro da família. Além disso, Sônia ainda precisa cuidar da casa, dos sogros que têm mais de 80 anos e também de Bruninho, fruto da relação de Eliza Samudio com o ex-goleiro do Flamengo Bruno, um caso de feminicídio que ganhou grande repercussão no Brasil em 2010 e que, até hoje, gera um debate sobre machismo e falta de empatia.

Relembre: Eliza tinha apenas 25 anos quando desapareceu em 2010. O jogador Bruno, então goleiro do Flamengo, foi apontado como mandante do homicídio e da ocultação do cadáver da jovem. Após julgamento, ele foi condenado a mais de 20 anos de prisão e cumpre a pena em regime aberto. O corpo de Eliza nunca foi encontrado.

“Tem muita gente que faz esse tipo de comentário, de crítica. ‘Porque ela não vai trabalhar?’, dizem. Quem me conhece, sai em minha defesa, sabe que não tenho condições de trabalhar com um marido em estado vegetativo, um neto pequeno, sogros idosos. Eu preciso limpar a casa, lavar a roupa, ficar com meu marido no hospital, acompanhar o meu neto nos treinos. Eu estou me desdobrando”, relata Sônia em entrevista exclusiva ao Terra. “O Hernane nunca deixou faltar nada em casa. Eu nem fazia mercado. De vez em quando eu ia com ele, mas era sempre ele que fazia”, lembra.

Além da vaquinha, que até este sábado, 16, já constava com mais de R$ 28 mil arrecadados dos R$ 30 mil pedidos pelo financiamento, Sônia também conta com ajuda voluntária de amigos. “Eu nunca fui de pedir nada, tanto que não fui eu quem criou a vaquinha, foi a Maria do Carmo”.

“Eu me responsabilizo”

“A vaquinha foi uma decisão minha. Eu me responsabilizo”, deixa claro Maria do Carmo em conversa com a reportagem. Madrinha de batismo de Bruninho e também presidente do grupo Vítimas Unidas, a amiga de Sônia acompanha o caso Eliza Samudio há muitos anos. “Nesse tempo, nossa amizade foi crescendo”, relata.

A ideia de criar uma página de financiamento coletivo surgiu pensando nas dificuldades financeiras que Sônia pode vir a enfrentar agora que seu marido está internado. Hernane é autônomo e, sem poder trabalhar, não é remunerado. Além disso, Maria do Carmo também diz que o ex-goleiro Bruno, pai biológico do filho de Eliza Samudio, jamais pagou pensão para o menino. “Apesar de ter reconhecido o filho, Bruno nunca pagou pensão, o que dificulta ainda mais a situação da família”, acrescenta.

“A Sônia é uma mulher que cuida da casa, cuida dos sogros idosos e cuida de uma criança com um histórico de muito trauma, muito peso”, lembra ainda. “Ela também precisa resolver questões burocráticas no hospital onde o marido está internado. Não criei a vaquinha porque a Sônia precisa de dinheiro para luxos. Estamos falando de uma mulher que está vivendo uma situação atípica, com duas tragédias em uma vida”, ressalta.

“Como vou contar para os pais dele?”

Hernane Silva sofreu a primeira parada cardíaca no dia 28 de fevereiro. Sônia, que estava na casa dos sogros, estranhou o fato do marido não ter ligado para ela, como sempre fez nos quase 27 anos de casamento. Quando conseguiu contato no telefone pessoal de Hernane, foi uma funcionária da Santa Casa de Campo Grande (MS) quem atendeu. No hospital, ela soube que demorou 40 minutos para que socorristas ressuscitassem seu marido que, nesse meio tempo, ainda sofreu outra parada cardíaca.

Sônia conseguiu visitar o marido no dia 1º de março. Hernane estava internado na UTI e havia sido entubado. Por conta da massagem cardíaca dos socorristas para fazer seu coração voltar a bater, ele aspirou suco gástrico e desenvolveu uma pneumonia. Seu quadro era grave e os médicos não conseguiam estabilizá-lo. Hernane sofreu uma nova parada cardíaca e, após exames, ficou constatada uma lesão no cérebro. Ainda que o marido de Sônia consiga sobreviver, segundo os médicos, seu estado vegetativo é irreversível.

Quando soube dessa notícia, Sônia se desesperou mais por causa da família do que por ela própria. “Na hora eu pensei: ‘Como eu vou contar isso para o pai do Hernane? Para a mãe dele?’ É muita dor para uma mãe”, lembra, muito emocionada. “Minha sogra está sendo forte, tem me auxiliado em casa, mas tenho medo de acontecer alguma coisa. Se meu esposo falecer, como ela vai ficar? O Hernane é aquele filho que liga todos os dias para a mãe, sabe?”

“A situação médica dele agora é muito crítica. E ninguém sabe ao certo se ele vai passar por essa. Os médicos falam que ele pode aguentar por anos, meses, mas também por dias ou até por horas”, detalha. “Hernane sempre foi meu companheiro, tem muitos amigos e é uma pessoa muito querida.”

Sônia também tem muito carinho pela sogra por ela ter ajudado no momento mais difícil de sua vida. “Quando eu trouxe o Bruninho para casa, eu estava muito mal psicologicamente. Acabei emagrecendo 17 quilos e ela que me obrigava a comer. Ela me dizia que eu precisava me fortalecer porque meu neto precisava de mim agora”, recorda.

O pai do Bruninho

Além de dividir essa dor com os sogros, Sônia não deixa de pensar em seu neto Bruninho, o “presente” – como ela mesmo fala – que a filha Eliza deixou para ela. “O Bruninho chama o Hernane de ‘pai’, porque ele é o verdadeiro pai dele, ele que o criou”, conta Sônia em conversa com o Terra.

 
Eliza Samudio com Bruninho no colo
Foto: Reprodução
 
 

Hoje, com 12 anos, Bruninho - como é chamado - ainda não conseguiu visitar o pai Hernane no hospital “Ele ainda está em dúvida, porque é uma situação muito pesada para ele”, explicou Sônia que, assim como o neto, faz acompanhamento psicológico, o que é essencial para enfrentar a situação.

“O Bruninho sabe da condição do pai, o que deve ser muito difícil para ele. Já é difícil para adultos, né? Eu vou respeitar se ele quiser visitar o pai no hospital ou não. Se for fazer mal, se for trazer algum trauma do passado para ele, eu vou entender”, pontua Sônia.

 

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